Então que a vida em Utrecht vai bem, obrigada. Tou atrasadérrima nos meus relatos, mas é porque as coisas têm sido bem agitadas por aqui e a carga de trabalho tá no nível "tenho que defender minha tese em junho". Sorry. Deixa eu dar uma atualizada em vocês.
Meu primeiro dia "oficial" na universidade foi segunda, dia 07. O Norbert me levou na sala de um monte de professores pra me apresentar, e um deles já quis se reunir comigo na mesma semana. O Norbert também me levou pra almoçar no clube dos professores, onde eu pude experimentar uma sopa de mostarda tipicamente holandesa (e absurdamente deliciosa) e um prato típico holandês: croquete. Juro! O cardápio tava todo em holandês, aí ele foi me explicando o que era cada coisa. Quando chegou no croquete ele começou a me explicar que era tipo um bolinho, assim e assado, e eu disse: se é o que eu tou pensando a gente tem isso no Brasil também. O nome? Kroketen. Sim. Eu comi. É infinitamente mais sofisticado que os croquetes brasileiros, mas é basicamente a mesma coisa e é bem gostoso. Nesse dia conversamos bastante, depois fui trabalhar no meu escritório, para o qual até hoje não tenho chave, e depois fui na reunião do grupo de sintaxe, que foi bem legal.
Claro, antes do grupo de sintaxe eu tive que correr na estação central pra botar crédito no meu ov-chipkaart, senão ia ter que voltar pra casa a pé. A boa notícia é que eu consegui chegar na estação sozinha e achei sozinha as máquinas pra carregar o cartão. A má notícia é que as máquinas só aceitam cartão, e eu queria pagar em dinheiro porque né, não tenho cartão. Fui me informar e pra carregar com dinheiro tinha que ir no mesmo lugar em que eu comprei o cartão e esperar forever numa fila. Até que não demorou tanto e eu ainda me diverti com as pessoas falando comigo loucamente em holandês. A má notícia é que pra recarregar com dinheiro tem que pagar €0,50. Aproveitei e já tasquei €50 pra não ter que ficar voltando lá toda hora. Só depois é que eu percebi que a estação na verdade é muito perto da universidade e dá pra ir a pé, mas mesmo assim, ficar recarregando toda hora é um pé no saco.
Acontece o seguinte: aqui na Holanda não existe cheque. Todo mundo tem uns tais chipknip, que são cartões com chip que se usa pra pagar absolutamente tudo. Eu achei que fosse um cartão de débito vinculado à conta corrente, mas não é: a gente tem o cartão e carrega crédito nele, que nem no cartão de ônibus. E aí usa pra pagar coisas. Serve basicamente pra não ter que carregar dinheiro pra cá e pra lá. E por exemplo, a cantina do Transcomplex, onde eu trabalho, e as máquinas de café e refrigerante da universidade só aceitam chipknip, não aceitam dinheiro nem moedas.
Também não sei se eu já contei como funciona o ônibus... É assim: não tem cobrador. O ônibus que eu pego é biarticulado, ou seja, é do tamanho de três ônibus (tipo os de Curitiba). Mas tem ônibus normal também, nas outras linhas. A única forma de pagamento são os ov-chipkaart. Do lado de cada porta (são 4 no biarticulado) tem duas leitoras, e a gente encosta o cartão na entrada e na saída. Aí ele desconta o valor da "corrida". Sim, a gente paga por quilômetro rodado. Numa cidade como São Paulo isso jamais funcionaria, mas aqui, como é pequeno, acho até justo. Na ida pra estação, por exemplo, paguei €0,14, mas a corrida daqui até a universidade é €1,35, que eu até acho bem razoável também. Os trens funcionam no mesmo sistema e acho inclusive que o cartão é o mesmo. Também tem outra: pra entrar e sair por qualquer porta que não seja a dianteira a gente tem que apertar um botão pra porta abrir. O motorista só controla a porta da frente. E antes de as portas fecharem soa um apito avisando que elas vão fechar, que nem no metrô.
Pra quem tá se perguntando se tem sanção pra quem não encosta o cartão, eu respondo: volta e meia sobem controladores no ônibus e passam teu cartão numa leitora que indica se tu encostou o cartão na entrada do ônibus ou não. A multa pra quem é pego é bem alta, pelo que me disseram. (Sim, eu peguei controladores uma vez, na semana passada. É como na Itália, mas em Siena ainda era bilhete de papel e tinha que validar na máquina na entrada. Se não validasse, ou não tivesse bilhete, e um controllore chegasse, a multa era bem salgadinha também. A vantagem de Siena é que tinha um bilhete mensal de €30 que a gente comprava e validava e podia andar o dia inteiro de ônibus por um mês. Só tinha que estar sempre com o bilhete na mão, caso entrasse um controllore.)
Bom, mas aí na terça eu tive uma reunião com a coordenadora da pós-graduação. Foi uma reunião rapidinha, só pra gente se conhecer e tal. Todo mundo aqui se preocupa muito com o meu bem-estar, se eu tou me adaptando, se eu tou feliz e satisfeita, só falta perguntarem se eu tou comendo direitinho. Tratamento vip total. Eu tinha a impressão de que era porque o meu dinheiro ainda não tinha saído, mas agora saiu e as pessoas continuam me tratando da mesma forma. Aliás, durante o período de míngua durante o qual eu não sabia quando veria a cor do dinheiro, eu achei que em algum momento alguém ia abrir a carteira e me dar dinheiro, mesmo eu dizendo que por enquanto tava tudo tranqüilo porque eu tinha trazido uma reserva.
Na terça eu também fui ver onde era a biblioteca e fazer a minha carteirinha. Foi um processo relativamente rápido, apesar de a moça ter demorado um pouco a entender qual era o meu status na universidade. Ela também não cadastrou minha SOLIS-ID no sistema da biblioteca. O SOLIS-ID é a minha identificação no sistema: com ela eu acesso o computador, meus e-mails, meus compromissos, e deveria acessar também a biblioteca. Assim, eu uso a SOLIS-ID pra tudo, menos pra biblioteca. Paciência.
A SOLIS-ID é muito inteligente: ela permite que eu acesse o meu "computador pessoal" em qualquer computador da universidade. É assim: quando a gente liga um computador e entra com a ID, ele monta todas as nossas preferências pessoais, programas, documentos em qualquer computador do qual a gente esteja acessando. Sem contar que o sistema de comunicação é todo pelo Microsoft Outlook: ali as pessoas agendam compromissos contigo, tem o catálogo de endereços, telefones e salas de todo mundo, enfim, é bem prático.
Na quarta teve a primeira aula da matéria do Norbert sobre localidade. As aulas aqui vão das 13:15 até as 17:00. Basicamente eu sou a única aluna de doutorado na aula, o resto é de alunos de mestrado. A aula vai ser ministrada em conjunto pelo Norbert e pelo Craig Thiersch, que é americano mas trabalha aqui na Europa. Na primeira aula foi só o Norbert e o assunto foi ilhas e subjacência, basicamente. As próximas aulas serão sobre barreiras (talvez a minha última chance de aprender direito barreiras, por sinal) e minimalidade relativizada. Bem bom.
Como a aula era do lado da biblioteca, aproveitei pra ir lá tentar comprar um chipknip pré-pago. A Maaike, coordenadora da pós, foi quem me deu a dica de que eu podia conseguir chipknips pré-pagos descartáveis lá. E realmente, tem uma máquina que a gente escolhe se quer de €10 ou €20, coloca o dinheiro e ele te cospe um cartãozinho. O funcionário da biblioteca me ajudou a decrifrar o holandês, e eu comprei um de €10 pra testar. Usei no intervalo da aula pra comprar uma latinha de Coca por €0,99. Funcionou.
Na quinta já tive minha primeira reunião e devo confessar que eu tava me cagando de nervoso. Me preparei muito, porque a reunião era com o Denis Delfitto, que é italiano e é um dos papas dos nominais nus. Devo dizer que em cinco minutos o nervoso passou por completo: ele é ótimo, perfeito, fantástico e maravilhoso e eu quero ser como ele quando eu crescer. E ele é muito italiano, no melhor sentido do termo. Ficamos horas conversando e não passamos da metade do handout. Ele ficou muito empolgado com a minha pesquisa e já marcamos outra reunião pra semana que vem. Foi muito bom ouvir de uma autoridade no assunto que o meu trabalho é interessante e que eu sou uma ótima lingüista. Quero ele na minha banca!
Na sexta choveu (ooooooh, jura?) e eu fiquei em casa. Só saí no final da tarde pra buscar meus livros na biblioteca. Explico: o sistema de biblioteca aqui é diferente de todos os que eu já vi. A gente procura o livro no catálogo online. Aí se tem e tá disponível a gente pode reservar pela internet. Até aí nada de mais. O detalhe é que tem mais de uma biblioteca, e a gente pode pedir pra retirar o livro onde quiser. Eu queria livros daqui e do centro: reservei e mandei entregar aqui. Se é da mesma biblioteca, demora 4 horas pra ficar disponível; se vem de outra, 24 horas. Eu reservei vários na quinta e na sexta de tarde fui buscar. Eles estavam lá bonitinhos na prateleira de reservas com um papelzinho escrito "Simioni". O funcionário, muito prestativo, me ensinou a retirar no self-service: escaneia o cartão na leitora, empilha os livros no local designado (de cinco em cinco), o sistema escaneia os livros e depois tu só escolhe se quer recibo impresso ou via e-mail. Pra devolver é a mesma coisa: tu mesmo empilha os livros, escaneia e enfia numa portinhola. Muito bom.
E preciso dizer que choveu o final de semana inteiro de novo?
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