Então que eu comecei a me sentir meio mal já na festa de Natal, e não melhorou quando eu cheguei em casa. A Azadeh viu que eu não tava bem e me deu um treco iraniano milagroso pra tomar. Não sei o que era, mas sei que me senti bem menos pior e pelo menos consegui dormir. Mas meu estômago só parou de se revirar lá pelas cinco da tarde do dia seguinte. Aí eu consegui voltar a comer alguma coisa, muito de leve. Mas melhorar mesmo, 100%, sem nenhuma dor no estômago, só dois dias depois do ocorrido. Que chato, achei que eu ia conseguir voltar invicta, foi a primeira vez que eu passei mal com comida por aqui, e olha que oportunidades não faltaram. Enfim. Acontece.
O que me deixou mais chateada é que enquanto eu me contorcia de dor de estômago na cama o dia inteiro, Deus resolveu atender as minhas preces e mandou uma neve daquelas. Começou às onze da manhã e só parou no finalzinho da tarde, provavelmente minutos antes de eu conseguir me por de pé e comer alguma coisa. Olhei pela janela e tava tudo branquinho branquinho:
Um pouco mais tarde, o baiano veio me visitar pra ver como eu tava e aí descemos pra pisar na neve, ver a neve, lamber a neve, mexer na neve e jogar bolas de neve um no outro. Só não fizemos um boneco porque tava frio demais pra ficar mexendo muito na neve, e porque meu estômago tava doendo ainda quando eu me mexia. Mas o que vale é a intenção.
uma bola de neve momentos antes de ser arremessada |
isso sou eu tomando uma bolada de neve |
escolhi de propósito o cantinho com mais neve pra enterrar os pés :P |
Encostar na neve recém-caída é como encostar naquele gelinho farelento que se forma em freezers e congeladores de geladeira. É macio, gostoso e faz cócegas.
No dia seguinte, sexta-feira de tarde, ainda tinha neve por tudo. Fui pra universidade encerrar minha conta no banco e entregar três mil livros na biblioteca e aproveitei pra tirar umas fotos do campus.
no fundo, a McKeldin. que diferença dessa foto pras fotos que eu tirei no verão! |
E as fotos aí embaixo foram tiradas hoje, domingo, três dias depois que nevou. Vejam como ainda tem bastante neve acumulada. E agora, quase meia noite de domingo, acabei de olhar pela janela e ainda tem neve acumulada. É bem provável que não suma tudo antes de eu ir embora na terça. :)
O ruim é que a neve vai ficando perigosa e nojenta. Perigosa porque em alguns pontos ela descongela, mas não dá tempo de evaporar tudo antes de a temperatura baixar de novo. Aí ela recongela, mas em vez de ficar com aquela consistência farelentinha vira uma grande pedra de gelo mesmo: muito escorregadia! Por isso que todo mundo joga sal nas calçadas e o serviço de limpeza pública passa pra tirar toda a neve da rua: o risco de os carros patinarem e causarem acidentes graves é muito grande. Fico imaginando como seria se nevasse no Brasil, do jeito que os nossos governos costumam ser ágeis e eficientes pra lidar com enchentes e demais desastres naturais... E fica nojenta porque a cor vai mudando, especialmente a neve que se acumula no meio-fio vai ficando marrom, preta, não é nada bonito. Mas a neve que fica nas graminhas e nos telhados é linda e eu tou fazendo questão de pisar por cima sempre que possível. Bem adulta, eu... hehehe.
Ah, sim! Nada a ver com o assunto "neve", mas eu preciso contar duas coisas que aconteceram por esses dias:
1. Encerrando a conta no banco
Na sexta fui encerrar minha conta no banco. Alguns de vocês sabem o parto que foi encerrar a minha conta conjunta da FAPESP no BB na véspera de vir pra cá. Pra quem não sabe, um resumo: fiquei na agência das 10 da manhã às 4 e meia da tarde, sem almoço, sem água e sem saber quem eu mataria primeiro se tivesse a oportunidade.
Aqui? Entrei na agência e imediatamente fui atendida. Perguntei o que precisava pra fechar a conta. Resposta: saque todo o seu dinheiro e depois de 5 dias sem saldo e sem atividade sua conta será encerrada automaticamente. Entrei na fila pra sacar o dinheiro e em menos de 5 minutos estava sendo atendida por um funcionário muito simpático (como todos os que me atenderam até hoje) que, quando eu pedi pra sacar tudo, perguntou se eu estava encerrando a conta, quis saber por que, falei que eu tava voltando pra casa, ele perguntou onde era, quis saber quanto tempo fiquei aqui, se eu tinha gostado, o que eu fazia, enfim, muito muito simpático. E em menos de dez minutos minha conta estava encerrada.
Aliás, isso é uma coisa engraçada: os americanos são meio distantes, não são de dar confiança e sair fazendo amizade com todo mundo e tal. Brasileiro tem essa mania de conhecer alguém hoje e amanhã já chamar de amigo (eu sei que eu sou brasileira, mas eu acho isso estranho e não sou assim). Aqui demora um bom tempo pra fazer amigos desses pra quem a gente conta coisas pessoais, etc. Mas todo mundo se trata muito bem em toda e qualquer circunstância e as pessoas sempre vão puxar assunto contigo, seja em College Park, seja em Nova York. Sempre. E dão bom dia quando passam por ti na rua, mesmo que nunca tenham te visto, e se vêem que tu precisa de ajuda te ajudam. Hoje mesmo tinha uma senhora no metrô tentando vestir o capuz do casaco; ela tava com dificuldade e imediatamente uma outra senhora que tava por perto foi lá e ajudou. Eu acho isso bem legal.
Moral da história número 1: eu amo o meu banco americano, seja ele o Chevy Chase ou o Capital One.
Moral da história número 2: ser simpático é culturalmente valorizado por aqui. Raramente a gente é mal atendido nos lugares. Aliás, o atendimento aqui tende a ser bem melhor do que no Brasil, que se considera o rei da hospitalidade. Pois digo pra vocês: no Brasil tem muito mais balconistas com cara de quem tá te fazendo um favor. Mesmo em comparação com College Park, que não é assim um grande exemplo de civilidade.
2. A perseguição
No dia da superneve, que eu quase morri, teve uma super perseguição policial aqui na frente de casa. Eu me recolhi cedo, umas nove da noite, e fiquei deitadinha na cama, quietinha, assistindo meus seriados. Por volta das onze e meia eu fui no banheiro, no claro intuito de voltar pro quarto, apagar a luz e dormir. Mas quando eu tava no banheiro ouvi gritos na rua, gritos desesperados, pra ser mais exata. Quando voltei pro quarto, olhei pela janela e não vi nada. Apaguei a luz. Nem cinco minutos depois, encostou uma viatura da polícia bem aqui na frente. Desceram dois policiais com lanternas acesas e desceram correndo aqui pela lateral do prédio. Dali a uns minutos apareceu outra viatura, ficou um pouco por aqui, um dos policiais voltou, conversou com os que tinham chegado. Depois chegou outra viatura. E um furgão com cães farejadores. E os policiais dê-lhe apontar a lanterna pra tudo quanto era lado, pras árvores, pra neve, embaixo dos carros, e os cães farejadores farejando, e as luzes das viaturas acesas iluminando a vizinhança inteira (uma viatura já é escandalosamente iluminada, imaginem seis e um furgão).
Claro que desisti de dormir e fiquei na janela, discretamente, tentando entender o que tava acontecendo. Também fui na sala e tranquei a porta loucamente, afinal a porta do prédio não tem tranca nenhuma e algum fugitivo podia tentar se esconder aqui dentro. Entrei na internet pra tentar ver notícias de Hyattsville, mas não achei nada que estivesse acontecendo naquele momento. Sei que fiquei acompanhando as buscas, inclusive a tentativa de arrombamento de um carro que tava estacionado por aqui, até as duas da manhã. Como não entendi nada, não tive coragem de descer pra perguntar, e parecia que eles não iam embora tão cedo, desencanei e dormi.
No dia seguinte, tentei descobrir o que tinha acontecido, mas não encontrei nenhuma notícia na internet, nem encontrei o Stan aí pela frente (o super Stan tudo sabe e tudo vê). Só hoje descobri: foi um assalto (na verdade, há controvérsias se foi um assalto ou dois). Perceberam? Um assalto (ou dois) gerou toda essa comoção, seis viaturas, pelo menos dez policiais, cães farejadores, todos rondando durante horas pra capturar o criminoso. Igualzinho ao Brasil.
Um comentário:
Minha filha, seja lá o que for este troço iraniano milagroso, lícito ou não, por favor, me manda umas 5 ou 6 toneladas. Meu estômago é meu maior inimigo!!
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