quarta-feira, 16 de março de 2011

De como lavar uma calça boa sem ter tanque

Contexto: 

Eu tenho duas calças de alfaiataria, de corte impecável, que eu comprei nos Estados Unidos pra me proteger do frio. Uma delas é de lã e tem forro, a outra é de um tecido bem grosso. E nenhuma das duas pode ser lavada na máquina, muito menos secada em secadora.

Pois bem. Eu hoje resolvi lavar uma delas. Na verdade eu resolvi lavar as duas, mas deu tanto trabalho que eu só lavei a que não tem forro. 

O método: 

Primeiramente, encha um balde com água na pia do banheiro e adicione um pouco de sabão líquido. Importante: não use água quente, mesmo que a água da torneira esteja congelando, porque isso pode danificar a calça. A calça custou caro e você não tem dinheiro para comprar outra; portanto, congele os dedos se preciso for.

Com o balde dentro da pia, mergulhe a calça no balde várias vezes, delicadamente, até encharcar bem (o delicadamente não é tanto pela calça, mas pelo aguaceiro que fica no banheiro). Esfregue as partes que porventura precisem ser esfregadas.

Retire a calça de dentro do balde e, segurando ela sobre a pia com uma mão (pra não pingar no chão), despeje a água do balde (devagar, porque a pia e rasa e transborda fácil). Coloque a calça dentro da pia, dê uma enxaguada no balde e encha novamente.

Mergulhe novamente a calça no balde para desensaboar. Não vai dar muito certo. Esvazie novamente o balde, tomando os mesmos cuidados anteriores. Largue o balde no chão, ligue a torneira e desensaboe a calça. Também não vai dar muito certo, e o chão vai ficar completamente ensopado. Suas mãos, por outro lado, já estarão anestesiadas pela água gelada.

Numa última tentativa antes de sentar no chão molhado, chorar e jogar a calça pela janela, pendure a calça bem esticadinha na torneira do chuveiro, remova o chuveiro do suporte (nesse momento, pare e dê graças aos céus porque você mora na Europa, essa terra em que todos os chuveiros são móveis), ligue a torneira e percorra toda a extensão da calça várias vezes com o chuveiro, sempre de cima para baixo, até você sentir que não há mais nem uma gota de sabão no tecido (aviso: isso pode demorar).

Encha novamente o balde, dessa vez adicionando amaciante à água. Mergulhe a calça no balde pela última vez, deixe um pouquinho e retire. Tente torcer a calça na pia do banheiro. Descubra que é possível molhar cantos que você não tinha conseguido molhar ainda. 

Leve a calça até o chuveiro (a essas alturas, não precisa ter muito cuidado pra não molhar o chão), tire suas pantufas quentinhas, arregace as calças, pise no chão gelado e molhado com as pernas beeeem abertas pra não molhar as calças e torça a calça com todas as suas forças. Não vai ser o suficiente. Deixe a calça pendurada na torneira do chuveiro por algumas horas.

Pegue a calça, que ainda estará pingando, estenda um pano de chão embaixo do varal de chão. Resista à tentação de enfiar a calça na secadora. Resista à tentação de enfiar a calça na secadora. Resista à tentação de enfiar a calça na secadora só por vinte minutinhos pra tirar o grosso da umidade. Pendure a calça.

Tempo de secagem:

Quando acabar de secar eu conto.


P.S.: Lavar essa mesma calça ajoelhada do lado da banheira em Maryland e deixar dois dias inteiros pingando na banheira foi pinto.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Mais um final de semana

Nesse final de semana não choveu durante exatamente uma hora: o tempo de eu correr no mercado comprar víveres e voltar. Parece praga! Mais um final de semana trancada em casa trabalhando e curtindo o melhor da programação local na tv. Considerando o ritmo da minha vida acadêmica no último mês (reunião em cima de reunião + tese), até que não é de todo mal.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Esqueci

No meio de todas essas novidades dicionarísticas, celularísticas e defesísticas eu acabei esquecendo que fui convidada pra fazer uma fala no grupo de nominais nus aqui da universidade no dia 17 de março. Quase caguei nas calças, afinal todos os fodões que sabem muito mais do que eu estão nesse grupo. Mas né, tá no inferno abraça o capeta hehehehe.

Agora sim: fui!

Estou armada!

Pra compensar a pasmaceira (e a bunda quadrada de tanto trabalhar) de quarta e quinta, as coisas hoje foram bem movimentadas.

Pra ser bem sincera, eu nem tava a fim de ir pra universidade. Tava aquela chuvinha fina que quase nem é chuva, é uma água pairando constantemente sobre as nossas cabeças, molhando nossas roupas, calçados e calçadas. Mas aí pensei que eu já não tinha ido dois dias... Na quarta não fui por causa da enxaqueca; e ontem não fui porque tinha tanta neblina que não dava pra enxergar um palmo na frente do nariz o dia inteirinho. Me senti um personagem de "Ensaio sobre a cegueira". Pros que não acreditam:


Enfim, encarei a elevadíssima umidade relativa (e absoluta) do ar e fui. Tinha reservado uns livros na biblioteca, então como vi que o ônibus ia demorar 10 minutos pra chegar, resolvi passar lá antes. Só que eu tinha esquecido que tinha reservado quatro livros, e aí tive que carregar tudo pra universidade. Azar, fi-lo. Cheguei no ponto e logo o ônibus veio.

Aliás, acho que isso eu não comentei: em todas as paradas de ônibus tem um painel eletrônico indicando quais são os próximos ônibus e quanto falta. Até hoje só vi eles chegarem um pouco adiantados, mas nunca vi atrasar. É impressionante. Também é impressionante que o Brasil seja o único país em que as paradas não são identificadas por nomes e/ou números e em que os ônibus não têm sistema de som e letreiro indicando qual é a próxima parada. Mas temos o pré-sal, que é muito melhor que isso, não é mesmo?

Desci do ônibus e apesar do peso na bolsa resolvi entrar na livraria e comprar meu dicionário. (Esse ímpeto foi motivado pelo e-mail que eu recebi ontem da funcionária da universidade pedindo mil desculpas pela demora na liberação dos meus euros queridos e jurando que semana que vem se resolve.) Pois bem. Entrei e pedi pra ver dicionários inglês-holandês, italiano-holandês ou português-holandês. A senhora que me atendeu, muito mas muito educada mesmo, me mostrou alguns, a maioria enormes e só de uma língua pra outra (sem o vice-versa). Acabei escolhendo esses dois volumes, que têm um tamanho bom e são bem completinhos: 


Cada volume era €9,99, logo, o combo saiu por €19,98. Achei bem razoável considerando que o único que eu vi no Brasil com preço razoável era um volume só, grande, nada portátil, por R$110. A moça colocou os dois num saco de papelão, daí viu que eu tava em apuros pra carregar minha bolsa e me ofereceu uma sacola de plástico. Foi a minha salvação, na hora de voltar pra casa botei vários livros na sacola hehehe.

Cheguei na universidade, bati um papo com o porteiro da manhã, peguei a chave-mestra, mais umas pastinhas e um bloco (mais coisas pra carregar, mas eu tava precisando) e fui dar um oi pro Norbert e pedir pra ele me ajudar a pagar meu aluguel. Cara-de-pau, eu sei, mas tem que estar pago até dia 1 e só tenho duas formas de pagar: no escritório da SSH com cartão de crédito (que é pago pelo meu pai) ou transferência bancária (que precisa de uma conta em banco, coisa que eu não tenho). Aí pedi pra ele fazer a transferência pra mim que eu dou o dinheiro pra ele. Morri de vergonha, mas expliquei o motivo e ele topou na boa. Menos mal.

Sentei pra trabalhar e a Emilienne me convidou pra assistir uma defesa. Era de fonologia e não me pilhei muito pra ir, mas ela me convenceu que era legal ir pelo social (e também porque só dura uma hora). Fui. 

As defesas acontecem no prédio principal da universidade, que é bem do lado do Dom e fica colado no nosso prédio. Foi lá que eu almocei com o Norbert no dia em que comi croquetes. A sala é cheia de pompa e circunstância e tem fotos do que eu acredito serem todos os reitores que a universidade já teve. Como a universidade é superantiga, obviamente tem fotos de reitores de peruca branca comprida (que nem as imagens do Bach).

Eu já sabia como eram as defesas aqui na Holanda porque elas são folclóricas (e todo mundo tem inveja). Vou explicar por quê:

- a defesa dura só uma hora;
- tem um monte de professores na banca, talvez mais de dez;
- alguns professores da banca são autoridades, não são da área de especialidade do candidato;
- cada professor tem direito a apenas uma pergunta;
- todos os professores usam togas e chapeuzinhos com formatos diferentes (imagino que cada chapeuzinho simbolize o ranking da pessoa);
- antes de a banca entrar, entra um bedel, também paramentado, com um cajado de metal. Ele bate o cajado no chão, todo mundo levanta e a banca entra e a defesa começa;
- passados 40 minutos de perguntas da banca, o bedel entra de novo, bate o cajado no chão e a conversa tem que encerrar. Não importa se tem alguém falando, tem que parar imediatamente (olha que maravilha!!);
- todo mundo levanta, a banca sai e delibera;
- a banca volta, o candidato e os seus dois paraninfos se apresentam diante da banca e um membro lê um documento de três páginas, aparentemente bem-humorado (porque todo mundo riu), em holandês (logo, eu não ri);
- todo mundo bate palmas e aí acabou. 

Ou melhor, não acabou. Vai todo mundo pruma outra sala onde tem uma recepção. O candidato se posiciona no fundo da sala, com um paraninfo de cada lado, a banca entra, cumprimenta o candidato e vai comer e beber. Enquanto isso, forma-se uma fila pra cumprimentar o doutor. Todo mundo cumprimenta o doutor antes de comer/beber. Como eu tava com a Emilienne, acabei cumprimentando o cara (que nunca me viu mais gorda). Depois voltei pro escritório porque achei estranho ficar fazendo social na festa do cara que eu nem conheço (não teria cerimônias pra fazer isso no Brasil, afinal já participei de todos os coffee-breaks de um congresso que nem era no meu prédio sem efetivamente participar do congresso, mas aqui a coisa é mais formal e o povo repara). 

Já eram quatro da tarde e eu não ia mais trabalhar mesmo. Resolvi sair à cata das lojas de celular pra comprar um chip. Olhei direitinho no mapa, deixei minhas coisas no escritório e fui, munida de chipknip de 20 euro, 15 euro em dinheiro, chave do escritório, cartão de acesso da universidade, passaporte, mapa e celular. Dei dois passos fora do escritório e dois caras vieram me pedir informação: "onde tem um pub legal por aqui?". Expliquei que cheguei há pouco tempo e não tinha como dar essa informação, eles agradeceram e seguiram o rumo deles. 

Eu achei tudo incrível. Já tinha feito aquele mesmo caminho no dia em que fui na loja da Apple com o Norbert, mas tava de noite e não deu pra ver muita coisa. Hoje tava de dia e as ruas tavam bombando, tinha muita gente passeando, comprando, andando. Vi restaurantes. E lojas. Lojas, muitas lojas de tudo quanto é coisa legal: roupas, calçados maravilhosos por preços bem acessíveis, bolsas, acessórios, coisas pra casa, enfim, muita coisa legal. Minha nossa senhora da bolsa em euros, faz a minha bolsa sair logo pra eu poder pelo menos sonhar em comprar uma das mil botas lindas que eu vi nas vitrines? Amém.

Caminhei um bom tantinho até chegar nas lojas. Ah, e no caminho vi duas coisas de interesse público: batata-frita enrolada num papel em forma de cone com maionese por cima (prato típico da culinária holandesa - sério!) e tamancos de madeira. Viu, mãe? Já sei onde comprar!

Entrei na Vodafone e fechei negócio. Comprei um chip pré-pago com €5 de crédito por €7,50 (mais €5 de bônus cadastrando o celular na internet, coisa que eu fiz assim que cheguei em casa). Na verdade eu queria comprar €20 de crédito, mas a máquina de chipknip deles tava quebrada e não deu. Vou ter que comprar outra hora. O bom é que dá pra comprar crédito em qualquer lugar, e a cada €20 de crédito a gente pode pedir bônus de mensagens ou ligações grátis. Bem tri.


Na volta pra universidade, duas gurias me pararam pra... pedir informações! Gente, que mico, nos Estados Unidos toda hora me pediam informações, e não só em College Park e D.C.. E agora aqui também! Será que eu tenho uma cara tão comum que pareço nativa em qualquer lugar? Será que eu pareço sempre tão bem entrosada à cultura local? Será que eu tenho cara de confiável? Não entendo. Só sei que é sempre assim. Tudo bem que eu me adapto fácil mesmo, já morei em 4 países (contando o Brasil), visitei um além desses (e me pediram informação lá também), já morei em 3 capitais brasileiras e realmente não sou do tipo que custa a se adaptar/não se adapta/chora de saudade. Mas daí a ficarem sempre me pedindo informação já é demais... rs.


Chegando em casa, tomei um semipau pra cadastrar o número na página em holandês, mas meu dicionário ajudou bastante e consegui. As mensagens que eles me mandam também são em holandês. Configurei a caixa postal e quando a gente liga a gravação fala meia hora em holandês, mas depois te dá a opção de mudar pra inglês e aí a vida fica bem mais fácil. Tou com dificuldade de receber mensagens (ou meus compatriotas tão com dificuldades de mandar), mas já recebi uma diretamente dos EUA, o que significa que o celular funciona pra mandar e receber mensagens. As funções do tipo msn acho que não vão funcionar porque né, aqui não é Estados Unidos e as companhias de celular ainda não chegaram tão longe no serviço. Mas uma mensagem pros EUA custa €0,29, bem pagável. Ligar pro exterior tá fora de cogitação a menos que aconteça uma coisa muito muito grave ou eu fique milionária, mas pelo menos posso avisar as pessoas de que estou viva usando o celular. Elas é que vão ter que aprender a me responder hehehehe. Mas já vi na internet como é, tem um zero na frente dos números de celular que tem que deixar de fora quando manda mensagem ou liga do exterior (sim, também tou me perguntando pra que que serve o zero se na hora de ligar a gente não usa, mas deixa quieto).

Agora, se me dão licença eu vou cair na cama e rezar pra amanhã fazer um dia razoável. Tou louca pra ir passear no centro!

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Mais clima

Mas já que estamos falando de tempo, deixa eu mostrar pra vocês as fotos do dia em que Utrecht virou Carlos Barbosa:



Naquela mesma noite, olha só que coisa linda apareceu na minha janela:


E ontem de manhã, com todo o frio que fez, os fiordes amanheceram todos congelados. Nem preciso dizer que hoje tava ainda mais congelado, né?


Neve

Hoje não foi um dia legal... Tive uma enxaqueca daquelas e não consegui fazer nada o dia todo: nem trabalhar, nem ir pra aula. Odeio acordar com enxaqueca, mas às vezes acontece e tem que agüentar, né? Tomar um remedinho, ficar quieta e esperar passar. Foi o que eu fiz.

Aí no final da tarde, quando eu finalmente comecei a me sentir melhor, Deus resolveu me dar um prêmio de consolação e mandou uma nevinha pra me fazer sorrir. Não foi nenhuma neve gigantesca, mas nevou mansinho por pouco mais de uma hora. Chegou a acumular um pouquinho e eu tirei algumas fotos pra vocês verem:

parece chuva, mas é neve

tudo branquinho lá embaixo

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Eu conheço alguém do Suriname!

Hoje acordei com temperatura de -4ºC e sensação térmica de -11ºC. E sol! Nada de nuvens, nada de neblina, nada de vento. Aliás, essa parece ser uma boa generalização sobre o clima daqui: os dias de sol sem nuvens sem vento e sem neblina são os mais frios. E hoje certamente foi o meu dia mais frio até agora: saí de casa 10:30 e ainda tava -2ºC com sensação de -8ºC. Saí de calça de lã, meia-calça de lã, meias peludinhas, bota de cano alto, segunda pele, básica de lã, cachecol, sobretudo, touca e luvas de couro e ainda assim tava sentindo um friozinho.

Entrei no ônibus, encostei o cartão pra pagar e nada. Tava dando uma mensagem diferente no visor da leitora, mas né, com o meu estupendo holandês não consegui entender. Também não tinha como anotar, porque eu tava de luvas e segurando meu copo de café. Fui até a outra porta ver e tava a mesma coisa. Sentei e rezei pra não aparecer um controlador. Depois notei que ninguém tava encostando o cartão pra entrar e sair e fiquei mais tranqüila: pelo menos se eu fosse presa não ia sozinha hehehe. Mas no fim não apareceu nenhum controlador e eu não fui presa.

Cheguei na portaria e o porteiro só me olhou com aquela cara de "ainda não tenho uma chave pra ti". Na verdade são dois porteiros: o que está lá de manhã quando eu chego e o que está lá no fim da tarde quando vou embora. O do final da tarde é o gaiato que me levou no departamento no primeiro dia que eu fui pra universidade. O outro não é gaiato, mas é bem gente boa também.

A história da chave tá meio chata, e ainda vai demorar pra se resolver, pelo jeito. Ultimamente eu não tenho tido problemas, mas na semana passada o porteiro tava doente, tava só um pessoal da segurança na portaria e eles não queriam me dar a chave-mestra. O carinha foi comigo até o escritório abrir a porta e disse que quando quisesse sair era só ligar na portaria que ele vinha de novo. O problema é que se eu quisesse ir no banheiro tinha que chamar o cara pra vir trancar e depois abrir de novo cinco minutos depois. Um saco. Nesse dia eu tinha uma reunião e só larguei minhas coisas e deixei ele trancar de novo. Como a minha reunião não durou nem 20 minutos, quando acabou lá fui eu atéééé a portaria pedir pra abrir de novo. Só que aí o alarme de incêndio tava tocando (!) e eles não podiam sair da portaria. E eu não tinha como entrar na minha sala. Fiquei lá feito um dois de paus, "lendo" um jornal holandês e vendo a brigada de incêndio passar. Pelo menos no jornal tinha uma matéria sobre o incêndio na cidade do samba... rs. Mas né, depois de uns quinze minutos lá esperando a tia da segurança me deixou pegar a chave-mestra. De cara feia mas deixou. E não, eu não sei se realmente teve um incêndio ou se foi alarme falso. Não consegui descobrir.

Enfim. Perto do meio-dia o pessoal bateu lá no escritório pra me convidar pra almoçar. Foi bem legal; tinha algumas pessoas que eu já conhecia, outras que eu ainda não conhecia, e pude conversar com todo mundo e socializar (e marcar mais reuniões pra discutir minha tese). Além disso, almocei com míseros €1,56 devidamente pagos com chipknip. Por esse preço tomei uma cumbuca de sopa, comi um pão e um pouco de salada de tomate. A sopa não tava essas coisas, tinha gosto de sopa de pacotinho, mas valeu, especialmente porque ajudou a aplacar o frio.

Fiquei trabalhando até as cinco. Até queria ficar mais, mas tava muito frio na sala. Liguei os aquecedores, mas não funcionou tanto quanto eu gostaria, eu tava congelando da cintura pra cima, então resolvi me mandar. O porteiro gaiato tava na portaria e perguntou se eu já tinha conseguido uma chave. Em holandês, evidentemente. Depois riu da minha cara de pastel e perguntou em inglês. Papo vai, papo vem, falei que a história da chave era discriminação porque eu sou do terceiro mundo, ele perguntou de onde eu era, e não é que ele é do Suriname? Nosso vizinho! Disse que não tá muito feliz de ter vindo pra cá e quer voltar dentro de três ou quatro anos. Falamos sobre a economia, sobre a extensão dos territórios nacionais, altos papos. E ele me disse que eu posso ficar no prédio até 15 pras 10 se eu quiser. Nessa hora ele anuncia no microfone que o prédio vai fechar e daí ele passa corredor por corredor, sala por sala pra ver se tem gente nas salas, pra ninguém ficar trancado. Depois ele tranca o prédio e vai embora. Ele até me falou que uma vez encontrou uma professora desmaiada numa sala: ela era diabética e o nível de glicose dela despencou e ela desmaiou. Se ele não tivesse entrado lá ela teria morrido, imagina! Fiquei aliviada de saber que se um dia me der um troço e eu estiver sozinha alguém vai me achar por volta das dez da noite hehehe.

Passei no mercado aqui do campus antes de ir pra casa, precisava comprar umas coisas. Ainda tenho que escrever um post especial sobre o meu processo de escolha de produtos no mercado... hehehe. Mas esse vai ter que ficar pra outro dia, porque amanhã eu tenho reunião (mais uma!) e preciso trabalhar mais um pouco.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

P.S.:

Não, eu ainda não vi ninguém de croc por aqui. Nem de abrigo. Rasgado ou não rasgado.

Não sou mais pobre :)

Então que na segunda-feira as super-secretárias do UIL OTS (Utrecht University of Linguistics, vulgo "meu departamento") me pediram pra passar lá pra falar com elas. O detalhe é que segunda-feira choveu o dia inteiro e eu não tava a fim de molhar, então resolvi ficar trabalhando no conforto e aconchego do lar.

(A verdade é a seguinte: chuva aqui significa garoa. Quando eu digo que aqui chove muito é porque chove o dia todo, às vezes por vários dias seguidos; mas é sempre garoa. Até agora não vi uma chuva "de verdade". E ninguém aqui usa guarda-chuva quando chove! Não sei se é porque a chuva é fraca ou se é porque eles tão acostumados com o fato de que sempre chove ou se é porque é muito difícil pilotar uma bicicleta e segurar um guarda-chuva ao mesmo tempo. Sei é que eu não gosto de molhar, mas também fico com vergonha de ser a única pessoa em toda Utrecht a estar com o guarda-chuva aberto.) 

Enfim, respondi perguntando se era urgente e a Mariëtte disse que era sobre o meu dinheiro, mas que não era urgente e podia ser no dia seguinte sem problemas. Achei que se eu saísse de casa só pra isso ia parecer a mais desesperada das desesperadas, então deixei pra terça. 

Ocorre que a coisa não é tão simples. Em primeiro lugar, o dinheiro fica num órgão da universidade e eu tenho que ir lá buscar com um formulário devidamente preenchido. Em segundo lugar, não posso pegar todo o dinheiro de uma vez só porque existe um limite na movimentação financeira diária que esse órgão pode fazer. Em terceiro lugar, a pessoa da nossa área que devia assinar o formulário junto comigo não estava lá nem estaria tão cedo porque tá doente. Em quarto lugar, a pessoa que cuida do dinheiro não podia me atender na terça porque estaria em reunião e sabe como é, aqui é tudo com hora marcada, pompas e cerimônias. Me pergunto quando conhecerei a família real. Enfim, não ia rolar pegar o dinheiro. Mas aí a Yvonne foi falar com o Martin, que além de ser um lingüista foda é o diretor do instituto, pra ver se ele podia pelo menos deixar o formulário assinado, porque ele é o diretor e a assinatura dele valia. 

Moral da história: ela voltou lá de dentro com o formulário assinado, pegou uma chave, abriu uma portinha onde tinha uma caixinha com vários euros e me deu alguns. Não sei se foi idéia do Martin, só sei que achei ótimo não ter que andar por aí à cata da tesouraria da universidade pra depois sair de lá de dentro com "eu tenho euros, me assalte" escrito na testa. Assim eles se ressarcem depois e eu não precisei me incomodar. Não sei se vai ser assim sempre, mas achei legal me quebrarem o galho mesmo sem eu ter pedido. Pelo contrário, com essa história do dinheiro eu tou toda hora falando que tá tudo tranqüilo por enquanto, não fiquei pentelhando ninguém porque é como eu disse, as pessoas todas me pareceram muito preocupadas com isso e eu não queria dar motivo pra se preocuparem mais. Só preenchi o formulário dizendo que eu concordava com o valor que me deram e corri pro abraço.

Impulso número 1: correr numa loja de sapatos e comprar vários sapatos-boneca, botas e bolsas de couro legítimo.

Impulso número 2: correr numa loja de roupas e comprar várias camisas, saias, aquele vestido de seda que chama meu nome todo dia de manhã na vitrine da loja, calças de alfaiataria e cachecóis, muitos cachecóis e essas boinas lindas que elas usam por aqui.

Impulso número 3: sentar e trabalhar. É, foi o que eu fiz. Trabalhei até as quatro e meia, depois tomei o rumo de casa. Mas como eu tava feliz porque né, agora eu tenho dinheiro, resolvi ir pro outro lado. Explico: eu sempre saio da universidade e pego a esquerda na Trans, depois esquerda de novo pra Achter de Dom, continuo pela Domstraat e subo reto até a Janskerkhof, onde eu pego o ônibus. Por esse caminho eu passo atrás do Dom, que é lindo de morrer. Aqui dá pra vocês verem:

a rua mais da esquerda é a Trans; a outra é a
Achter de Dom. Tirei a foto na Kromme
Nieuegracht

Nesse dia saí pra direita e me deparei com um mundo totalmente novo. A primeira coisa que eu vi:

Domtoren

E aí entendi: a torre não fica do lado do Duomo. Ou melhor, fica, mas não fica, tem uma rua que passa entre as duas. 

Dom

a torre mais de perto, pra vocês
verem o tamanho. É a construção
mais alta da Holanda

Dom mais de perto
Eu sei que as fotos não tão legais, tava frio e eu tava sem luvas e tinha muito trânsito de bicicletas e eu sempre tenho medo de ser atropelada porque os caras não têm noção do perigo e andam a mil por hora. Outra hora com mais calma eu tiro fotos bem decentes. Inclusive dá pra subir na torre, hehehe adivinha se eu não vou subir.

Voltei pro meu curso normal na Domstraat, mas aí embestei que queria andar e entrei nas ruazinhas transversais e aí tive que conter meus euros que queriam criar asinhas e sair voando pra fora do meu bolso. Entendam, pra quem passou seis meses morando na Croclândia e na terra do abrigo rasgado, ver roupas e calçados elegantes e bem feitos é um alívio. Ai ai.

Não, não entrei em nenhuma loja. Fiquei andando, vendo o que há de interessante por ali. As ruazinhas são estreitas, como em todo centro histórico de cidades européia, mas aqui a rua é dos carros e a calçada é estacionamento de bicicleta. Os pedestres deviam criar asinhas.

Mas é claro que teve UMA loja em que eu entrei. Não comprei nada, só bisbilhotei (ao menos por enquanto). Ganha um doce quem adivinhar.